Unick forex escritorio virtual 3

Proibida de operar, Unick é investigada por crime de pirâmide financeira.


De acordo com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia do governo responsável pela fiscalização do mercado de capitais, a Unick Forex está há mais de um ano proibida de operar. O órgão constatou que a empresa atua de forma irregular no setor de investimentos e levou o caso ao Ministério Público Federal (MPF), que abriu investigação por suspeita de crime relacionado à exploração de pirâmide financeira. A direção da Unick, que mantém escritório em Novo Hamburgo e centenas de clientes no Vale do Sinos, prefere não se manifestar.


A história da D9 Trader: processada por lesar centenas de vítimas na região.


A primeira medida da CVM contra a Unick foi em 19 de março do ano passado, por ato declaratório assinado pelo superintendente de Relações com o Mercado e Intermediários, Francisco José Bastos Santos. O documento, ao mesmo tempo que serve de alerta ao mercado, impõe sanção à empresa. "Por meio da página 'https://unick.forex' na rede mundial de computadores e redes sociais, efetua captação irergular de clientes para a realização de operações no denominado mercado forex", atesta o superintendente.


MULTA.


Ao impor suspensão imediata das operações, Santos frisa que, em caso de desobediência, a empresa está sujeita a multa diária de R$ 1 mil. Ele cita nove pessoas físicas e jurídicas como responsáveis pela Unick. O primeiro deles é Leidimar Bernardo Lopes, 38 anos, que seria o líder no Estado. Também são mencionados Alberi Pinheiro Lopes, Alberi Pinheiro Lopes Epp, Roberta da Silva Rossi, RR Consultoria de Serviços, Sebastião Lucas da Silva Gil, Feats Comunicação Criativa Lta, Israel Nogueira e Souza e Eduardo Fernando Macedo Nogueira.


Como a Unick Forex não acatou a determinação e manteve abertamente as atividades irregulares, conforme a CVM, foi instaurado um Processo Administrativo Sancionador, que está em fase de instrução. A decisão será de um colegiado da autarquia, com data de julgamento ainda não marcada. A sentença poderá proibir todos os operadores da Unick de atuarem no mercado financeiro, mesmo que em outras empresas, e impor multa milionária.


Apuração criminal também anda.


Em paralelo ao procedimento administrativo, a CVM denunciou o caso ao MPF, que apura na esfera criminal. O procurador da República em Novo Hamburgo, Celso Tres, já declarou que vê fortes indícios de fraude. “Não tenho dúvida que isso é pirâmide financeira.” Ele também se refere à InDeal, outra empresa com escritório em Novo Hamburgo que promete rendimentos que podem passar dos 15% ao mês , fora da realidade do mercado.


A prática da pirâmide financeira é enquadrada como crime contra a economia popular na lei 1.521 de 26 de dezembro de 1951 - obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos (“bola de neve”, “cadeias”, “pichardismo” e quaisquer outros equivalentes). Ela abre margem para acusações de estelionato, organização criminosa e lavagem de dinheiro.


Denúncias aumentaram.


A CVM revelou à reportagem que foi detectado "crescimento importante no número de reclamações e de denúncias de ofertas irregulares de serviços ou produtos financeiros". Segundo o órgão, foram instaurados mais de 400 processos de investigação nos últimos cinco anos. A autarquia orienta que o investidor não deve tomar decisões baseado em opiniões manifestadas em redes sociais. Acrescenta que é prudente não acreditar em ofertas de investimentos por meio de sites, normalmente acompanhadas de promessas de ganho rápido ou sem risco.


'Eles prometiam mundos e fundos'


Responsável pela maior investigação sobre pirâmide financeira no Estado , o delegado de Sapiranga, Fernando Pires Branco, detalha o funcionamento da D9 Trader no Vale do Sinos. Ele indiciou 34 suspeitos em setembro de 2022, dos quais 24 foram denunciados pelo Ministério Público, e apreendeu R$ 10 milhões dos líderes, entre dinheiro, carros e imóveis. O delegado recorda que o grau de ilusão dos investidores era tamanho que, mesmo sem ganhar os rendimentos anunciados pela D9, a maioria não foi à Polícia na esperança de ainda receber. “Eles prometiam mundos e fundos para as pessoas.” Com exceção do chefe no Brasil, em prisão domiciliar em Dubai, todos os réus respondem em liberdade. As estratégias da D9 eram muito parecidas com as da Unick Forex, conforme revelado ontem pelo Jornal NH .


Foto por: GES Descrição da foto: Delegado Fernando Pires Branco.


Como funcionava a D9? Delegado Fernando Pires Branco - A D9 era uma empresa que tinha atuação em todo o Brasil e em vários países, com uma célula muito forte no Rio Grande do Sul, liderada aqui no Estado por Márcio Rodrigues dos Santos, que foi morto posteriormente. Ele era de Sapiranga e fazia os negócios aqui. A célula no Estado era sediada em Sapiranga, por aquilo que chamavam de equipe elite V8.


Quando ela começou a atuar? Branco - A atuação começou bem antes da apuração policial, que teve início em janeiro de 2022 e se estendeu até a metade daquele ano, quando deflagramos a operação que resultou na prisão do Márcio Rodrigo dos Santos e outros envolvidos no esquema. Muitos foram indiciados.


Ficou comprovado que a D9 era uma pirâmide? Branco - Sim. Era evidente. Porque o negócio consiste no seguinte. As pessoas faziam um aporte inicial de capital, que eles diziam que seria aplicado numa bolsa esportiva de apostas sediada no Reino Unido. Com a renda obtida com o sucesso dessas apostas, remunerariam as pessoas de acordo com o que prometiam, que eram lucros extraordinários, irreais. Essa bolsa de apostas realmente existe, mas nunca aplicaram um centavo ali.


Mas aposta também se perde. Branco - Eles se diziam profissionais especializados em apostas esportivas, obviamente para enganar as vítimas.


Quais os percentuais prometidos? Branco - Dependia do pacote que a pessoa comprava. Os mais caros eram remunerados com um valor mais expressivo. Girava na média de 20% ao mês. As formas de aliciamento eram várias. Faziam palestras em que sorteavam veículos, principalmente motos. Eles prometiam mundos e fundos para as pessoas.


Esses prêmios sorteados eram retirados? Branco - Nunca aconteceu. Segundo eles porque as pessoas preferiam trocar essas motos por pacotes da empresa. Era mais uma forma de aliciamento. Mas a principal forma de aliciamento era a ostentação de um padrão de vida luxuoso, irreal para a maioria das pessoas. Os chefes gostavam de exibir carros de luxo, relógios caros, celulares, viagens nas redes sociais.


Quais eram os papéis dos indiciados? Branco - Existia uma denominação de acordo com a evolução ou função da pessoa na empresa, que, na verdade, era uma organização criminosa. Era o presidente, o capitão, o treinador, o coordenador, denominações que lembravam times de futebol para hierarquizar o sistema.


Em quais cidades agiram? Branco - Fizeram centenas de vítimas em Sapiranga e região metropolitana. Porto alegre, Novo Hamburgo, Igrejinha, Parobé, Rolante. Várias cidades. O grande chefe em nível nacional é Danilo Santana, natural de Itabuna, na Bahia. Ele morava nos Emirados Árabes, em Dubai, e dizia em vídeos nas redes sociais que o baiano virou dubaiano. Quando solicitamos, aqui em Sapiranga, a prisão preventiva dele, que foi decretada pelo Judiciário, o mandado foi cumprido pela Interpol e ele acabou sendo preso no aeroporto dos Emirados, em Dubai.


Ele chegou a participar da D9 em Sapiranga? Branco - Não. O presidente aqui era o Márcio, que chegou a ser preso, ganhou liberdade e foi encontrado carbonizado no porta-malas do carro em Balneário Camboriú. Não foi a única morte no Brasil de pessoas ligadas à D9. Fiquei sabendo de mortes em outros Estados de pessoas envolvidas nesse golpe.


Márcio tinha negócios de fachada? Branco - Ao cumprir mandado de busca na casa dele, apareceu uma situação relevante e pitoresca. Encontramos uma carta, que era uma espécie de memórias dele, em que narrava a participação em diversas pirâmides financeiras, entre elas a Telexfree e várias outras. Ele se definia como piramideiro. Narrava todas elas. Contava como começava nessas empresas. Para mascarar o crime, diziam que era empresa de marketing multinível, o que não é ilegal. Empresas que fazem essa espécie de coisa têm algum produto relacionado a elas. A D9 dizia que vendia um curso de trainning esportivo. Uma das primeiras coisas que provamos é que não faziam esses cursos. Quando comprava um pacote, o investidor ganhava um curso via Internet, que dizia transformar a pessoa em profissional. A maioria das pessoas sequer acessou esse curso.


Quanto essa célula de Sapiranga arrecadou? Branco - O golpe era muito amplo. Foram muitos milhões. Só com as 26 vítimas que ouvimos, a maioria de Sapiranga, quase R$ 1 milhão. Tenho convicção que não ouvimos todas. Muitas, mesmo quando não recebiam mais, se mantiveram na esperança e não procuraram a Polícia. Os próprios integrantes tentavam convencer os demais a aguardar. Lideranças coagiam as vítimas a não procurar a Polícia, afirmando que somente as que ficassem quietas receberiam. Além disso, muitas se recolheram para não se expor.


Há relatos de altas quantias perdidas? Branco - Temos notícias de pessoas que aportaram centenas de milhares de reais. Carros de luxo, imóveis. Há um cidadão que veio até nós para registrar que entregou para a D9 um Porsche Cayenne e outra caminhonete de luxo para receber os pacotes. É só um exemplo de pessoas que davam bens valiosos e altas somas em dinheiro. Eram iludidas, pois acompanhavam os créditos pela Internet, onde viam os rendimentos prometidos, que existiam, porém, só no mundo virtual.


E quanto a Polícia apreendeu? Branco - Só com Márcio, apreendemos dois Camaros e um Elantra, além de imóveis. Em bens como esses, foram cerca de R$ 4 milhões. Também apreendemos, de uma empresa ligada ao grupo, uma aplicação de R$ 6,5 milhões em bitcoins. A conta, que continua retida pela Justiça, transformou o dinheiro das vítimas em criptomoedas para impedir que fosse rastreado. Seria dividido entre os golpistas.


Aplicadores chegaram a receber dinheiro? Branco - No início, acredito que algumas pessoas recebiam porque não se sustentaria por tanto tempo. Mas chegou a uma certa altura que as pessoas não recebiam mais. E todo dia aparecia uma na delegacia para fazer ocorrência.


Qual era a participação na D9 do réu Danter Navar da Silva, atual diretor da Unick Forex? Branco - Ele integrava a D9. Ocupava o posto de capitão, mas, acima dele, havia vários. Ficou comprovada a participação e foi indiciado.


Considerando que a empresa Unick atua de forma parecida, o senhor acredita que também seja pirâmide? Branco - Não conheço os detalhes dessa empresa, da Unick, mas me parece que pode se tratar de uma nova pirâmide financeira. Parece outra modalidade do mesmo golpe. O golpe da pirâmide se renova de tempos em tempos.


Parece que não há vítima documentada dessa empresa. Branco - A Polícia depende das pessoas prejudicadas para poder agir. Se nenhuma pessoa até agora procurou a Polícia, é complexo realizar uma investigação. É difícil também fazer uma previsão de tempo de quando uma pirâmide vai ruir, mas a tendência de todas elas é que um dia aconteça e que as pessoas que entraram acabem ficando sem nada.


Como se forma e se quebra uma pirâmide? Branco - A pirâmide se sustenta com a entrada de novas pessoas para remunerar os que estão no topo. Quanto mais entram na base, maior remuneração dos de cima. Só que chega uma hora que não existem pessoas suficientes para remunerar todos que estão no esquema. Vai crescendo e o topo vai ficando muito grande. Quando não tem mais número suficiente para remunerar o topo, a pirâmide quebra. Se apropriam do dinheiro e os demais ficam sem nada. Os operadores, por terem acumulado grandes quantias, podem se esconder em qualquer lugar.


Golpe foi notabilizado por italiano que morreu no Brasil.


Foto por: Reprodução Descrição da foto: PIONEIRO: Charles Ponzi na década de 1920 Ao pedir a extradição do baiano Danilo Santana, em setembro de 2022, o juiz da 1ª Vara Criminal de Sapiranga, Ricardo Petry Andrade, fez menção à história do golpe. “O réu é acusado de chefiar organização criminosa voltada a lesar economia popular, coaptando investidores a depositarem suas economias em fundo relacionado ao sistema ponzi (pirâmide).”


O magistrado se referiu ao italiano Charles Ponzi, que emigrou na década de 1910 para a região de Boston, nos Estados Unidos, onde popularizou um negócio que já era explorado timidamente, mas que, com ele, ganhou notabilidade pela quantidade de investidores que obteve sob a promessa de rendimentos excepcionalmente elevados.


Ponzi dizia que os ganhos vinham do lucro com a compra e venda de selos estrangeiros, o que era uma farsa, pois nunca aplicou o dinheiro arrecadado nos cupons postais. Ele pagava os clientes com o dinheiro dos novos investidores, mas as adesões foram diminuindo e acabou faltando recursos para remunerar os mais recentes, que ficaram no prejuízo, e a estrutura desmoronou, como acontece com toda pirâmide financeira. Muitos chegaram a vender casas na expectativa de ganhos maiores.


O italiano arrecadou milhões de dólares, levava vida de luxo e teria comprado um banco se não fosse a intervenção do governo. Foi preso e deportado para a Itália em 1934. Em 1941, desembarcou no Rio de Janeiro, onde morreu em 1949, aos 66 anos, como indigente, cego e vítima de infarto.


Telexfree tinha produto vinculado.


A norte-americana Telexfree chegou ao Brasil em 2012, com a comercialização do Voip, um sistema de telefone pela Internet, mas o principal atrativo era a oferta de uma rápida e agressiva evolução financeira. Representantes organizavam reuniões, em que vendiam vida de luxo e ostentação. No primeiro ano, a empresa atraiu um milhão de clientes e arrecadou cerca de R$ 300 milhões, tornando-se a maior pirâmide financeira já erguida no País. Em julho de 2013, a Justiça a proibiu de atuar no Brasil.


Em 2022, um dos donos da Telexfree, o americano James Merril, confessou a fraude em acordo com o Ministério Público de Massachusetts. No ano seguinte, foi condenado a seis anos de prisão e à devolução de 140 milhões de dólares. O sócio no Brasil, Carlos Wanzeler, é considerado foragido da Justiça norte-americana. A esperança dos investidores brasileiros está nos bens bloqueados. Advogados do processo de falência da empresa negociam devolução de R$ 250 milhões.